sábado, 27 de agosto de 2011

Da próxima vez, segue o instinto

Se alguma vez os termos "espectáculo" e "grotesto" andaram a par, o filme "Vénus Negra", do realizador franco-tunisiano Abdellatif Kechiche, é o cúmulo ilustrativo. Longo. Pesado. Angustiante. Atrevo-me a dizer chocante.

Baseada na história verídica de Saartjie Baartan, mais conhecida por Vénus Hotentote, a película retrata de forma particularmente crua a exploração dos limites da curiosidade e da morbidez, numa altura em que os chamados shows de horrores percorriam as principais cidades europeias, levando vastas multidões a pagar bom dinheiro em troca daquilo que acreditavam ser uma aproximação ao exótico.

Escravizada, prostituída e até espiolhada por naturalistas da época, nem mesmo depois de morta Saartjie descansou com dignidade, tendo o seu corpo sido vendido ao Museu de História Natural francês pelo mesmo homem que a tinha comprado anos antes, após recusa deste em pagar o funeral da sua artista "estrela".


As consequências da ridicularização constante e da exploração de uma vida decadente, feita de infelicidade e bizarria, são retratadas no filme com especial densidade, tornando-se revoltante e tortuoso de assistir. Contribuem para isso longas cenas ininterruptas, de planos muito próximos, e a expressividade silenciosa de Saartjie, cujo rosto apático - à excepção de dois momentos - grita mais do que qualquer das restantes personagens barulhentas do filme.

A intenção do título é clara: questionar até onde chega a curiosidade humana perante algo ou alguém considerado fora do padrão. As caravanas de "aberrações" parecem ter perdido os seus adeptos no final do século XIX, mas mesmo hoje, fazendo uma pesquisa rápida no You Tube ou no próprio Livro do Guiness, se encontram exposições mórbidas semelhantes. Qual a diferença?

P.S - Não fiquei até ao fim do filme. Devia ter seguido o instinto que me "disse" que ia sair atordoada da sala. Nada de pessoal, Joana.

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